sábado, 29 de novembro de 2014

Lisbon - Day 15300 and something ...

Existe um canto lisboeta que é meu e onde não há gente parva. O único, onde me sinto em casa. Começa no Marquês de Pombal, vai pela Avenida da Liberdade fora e desagua na Baixa-Chiado, ramificando-se para a direita, esquerda e novamente para baixo, até ao Largo do Camões, Praça do Comércio e Rua da Madalena.
Esse era o caminho da aventura, quando eu era pequena. Percorri quilómetros com a minha mãe, vezes e vezes sem conta, por essas paragens. Era o caminho da liberdade, da alegria e da descoberta. Era o caminho que fazíamos quando eu não tinha escola e íamos às compras. Buscar roupa, pouca nesses dias. Buscar tecidos, botões, rendas, feiche-eclairs para a avó fazer as suas costuras. Levar sapatos ao sapateiro. Procurar relojoeiros antigos. Descobrir panelas na Pólux. Levar uma boneca ao Hospital de Brinquedos da Praça da Figueira. Procurar lãs coloridas para fazer camisolas. Ir aos Cinemas Tivoli, São Jorge e Condes. Ao oculista da Travessa de Santo Antão. Ao Coliseu assistir ao circo de Natal da Fidelidade. Mais tarde o Centro Comercial Guérin, o primeiro centro comercial da Baixa depois das Galerias do Chiado. Os Grandes Armazéns do Chiado e a R. Garret, cara e inacessível para nós na altura, mas onde a minha mãe gostava de passear e recordar onde ía com a Abuelita quando a mãe tinha dinheiro suficiente para frequentar as lojas exclusivas dessa rua. Nos Grandes Armazéns e quando o meu irmão ia connosco, envergonhava-me porque tinha um tique que era andar atrás de nós a pousar um joelho no chão. A minha mãe ria-se, eu zangava-me de vergonha. As floristas do Rossio. E tantas, tantas, tantas outras lojas e coisas que agora não me recordo.
Ontem andei por lá à procura de lojas de decoração e móveis e lembrei-me que é essa a minha Lisboa. Aí as pessoas não são parvas. São simpáticas, características e educadas. São engraçadas e agradáveis. As simples e as mais sofisticadas. Não as empregadas parvas novas das lojas novas. Essas não são dali, deviam ser expulsas daquela zona. Não pertencem ali, não lhe são nada, não percebem nada. Não são como os dois senhores que estavam na loja de candeeiros e que me fizeram rir e chorar de alegria e nostalgia. Perguntei-lhes o preço de um candeeiro e os senhores, um mais velho e outro gordo e mais novo, provavelmente o neto, reviraram a loja toda à procura da tabela de preços, enquanto murmuravam "Mas onde é que ela pôs isto?" Ri-me com eles, não deles. Ri-me e depois tive vontade de chorar, porque me fizeram lembrar o relojoeiro Sr. Martins, o sapateiro, a Dona Lurdes do talho, na R. de Santa Marta, onde íamos quase todos os dias às compras. O senhor deu-me um cartão da loja e pediu-me muitas desculpas e olhou para mim como os senhores antigos olham para senhoras jeitosas, com educação e uma pontinha de sedução enternecedora.
Tinha-me esquecido que é essa a minha Lisboa. Que nessa Lisboa eu sempre encontrei e ainda encontro ternura.

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Lisbon - Day 15300 and something ...

Algumas considerações:
 
* Primeiro foram os vistos dourados, depois o Sócrates e agora o BES - é impressão minha ou anda alguém a tentar acabar com Portugal?
 
* A Teresa Guilherme é maquiavélica. E por isso mesmo, e apesar de já se justificar um Big Brother para adultos, ela não quer porque sabe que com os adultos seria impossível enrolá-los à volta do seu mindinho como faz tão bem com os anormais que escolhe actualmente. Palavrões? Bahhhh isso já sabe a pouco. Pontapés? Coisa pouca .... O que está a dar são cuspidelas, insultos escatológicos e masturbações em grupo. Sim, porque sexo ao vivo também já é completamente démodé. A única coisa que falta é sexo durante as cadeiras quentes com a Voz a perguntar quantos pontos cada concorrente dá aos participantes. Porque é que ninguém fala disto? Se os comentadores acham que estariam a rebaixar-se ao falar disto, pensem duas vezes. Existe um pacto de silêncio em volta de uma das mulheres mais poderosas do país - ela manipula não sei quantos milhões de pessoas todos os dias antes, depois e depois do Telejornal e ainda em prime-time. E ninguém comenta isto? Acho que deviam ...
 
* E já agora, porque é que não há nenhum comentador que tenha a coragem de chamar os bois pelos nomes e dizer aquilo que toda a gente sabe - o Mário Soares está ché ché e não deveria aparecer na televisão a dizer bandalhadas. A velhice é uma tristeza e também uma realidade.
 
* E já que estou nesta onda, tudo o que se ouve e vê na televisão é manipulado, o que significa que vivemos literalmente num mundo virtual. A realidade existe ... algures ... por aí ... mas não sei onde ela está e não tenho nem tempo nem pachorra para a descobrir. Mas ao menos eu tenho consciência disso. Muitos há que não têm e isso também é triste.
 
* O Herman José trata a Vanessa mal como o caraças, mas aceitou trabalhar com ela. Isto é um paradoxo, ou não. Há gente que tudo faz para brilhar, mesmo que seja à custa dos outros. E gente há que permite que isso aconteça em directo, para todo o país assistir. Os circos já não são de vaidades, como Tom Wolfe escreveu. Isso era na década de 80. Hoje em dia os circos são de humilhações públicas e voluntárias. Voltámos aos gladiadores romanos, mas sem dignidade. Ao menos nesse tempo erra palavra ainda existia.
 
* Os vendedores deste país não trabalham. Não sei o que fazem, mas trabalhar é que não é. Devem conversar muito. Estive mais de um ano à procura de casa. Encontrei-me com dezenas de vendedores. Dois apareceram a horas e alguns ficavam ofendidos quando comecei a dizer que só esperava mais 5 minutos por eles .... (olhos abertos de estupefacção). Quando peço orçamentos, nunca me respondem antes de uma semana. Uma semana! Nasci no país errado. Uma semana é muito. Atrasos de 5 minutos também. Para os lisboetas não. Nunca compreendi isto. Palavra de honra que não. Mas sei que sou bicho raro. Deve ser da educação inglesa ...
 
* Passei a minha vida inteira à procura de ternura. Tenho a certeza que não a vou encontrar em Lisboa.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Sonho #3

Blue Lagoon
 
 
Como com todos os sonhos, é sempre melhor e pior do que se esperava.
A parte da lagoa mais bonita estava fechada, suponho que porque havia menos gente.
A Islândia inteira cheira a enxofre e a Lagoa Azul muito em particular. Mas é tal e qual como a coca-cola, primeiro estranha-se e torce-se o nariz, depois entranha-se e habituamo-nos.
Como, perguntarão? O cheiro a enxofre é provavelmente o pior cheiro do mundo, e talvez por isso e também por vir de debaixo da terra, seja associado ao demónio. Apelidei a Islândia de Bom Inferno, porque cheira a enxofre por todo o lado, mas as suas gentes são pacíficas e agradáveis e o país é um Paraíso gelado escondido nos mares do norte do Atlântico. Se tivesse deslizado no mapa-mundo um pouco mais para baixo, seria os Açôres, e vice-versa, se os Açôres tivessem navegado mais para norte, seriam a Islândia.
Antigamente, dizem-me, a Islândia estava, tal e qual os Açôres, cheia de árvores. Depois os vikings começaram a desbastá-las todas e a cortá-las para construírem os seus barcos guerreiros que atravessariam os mares até ao continente americano para conquistarem e pilharem outros povos. A Islândia acabou por ficar despida de verde. Dizem-me também que está em curso um plano de reflorestação em determinadas zonas e que isso irá alterar por completo a paisagem lunar islandesa. Quem a visite daqui a 10 anos, tempo de as árvores crescerem, conhecerá uma outra Islândia.
Eu conheci uma Islândia plena de constrastes, mas sempre nua. Ou branca de neve e gelo, ou negra de lava solidificada, ou multi-acastanhada de rochas de diversas naturezas. O céu, esse, é sempre o mesmo e muito parecido com o nosso - azul pontilhado por grandes nuvens brancas.
Talvez regresse em dez anos, para ver duas coisas que não consegui - as baleias e a aurora boreal. A caça às baleias deu apenas em 3 golfinhos tímidos e fugazes e a aurora boreal fez-se difícil por causa do tempo neblinado.
Cumpri, isso sim, o meu sonho, nadar nas quentes águas da Lagoa Azul, ao final da tarde. São mesmo quentes. Cerca de 38ºC. É fantástico. Cá fora estão 10º e lá dentro um forno. E são mesmo azuis. Um azul indigo forte e vaporoso. Vale a pena.