O Gladiador
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Entrou na arena.
O Sol quente da Primavera romana queimava-lhe a pele e trazia-lhe grossas gotas de suor à testa, que sentia escorrerem dentro do capacete de ferro, pelo rosto, até ao pescoço. Tudo lhe pesava, apesar de já estar habituado a tudo o que trazia no corpo. O capacete, a armadura, as correias e sandálias de couro, as armas, uma em cada mão.
Deu uma volta sobre si próprio e a multidão inundou-o, entonteceu-o, sufucou-o. Tudo lhe pesava porque se sentia ali, mesmo na arena aberta sob a torreira do sol, como se encapsulado, preso numa gaiola transparente. Respirou fundo. O som da respiração era pesado, debaixo do capacete.
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A multidão zurrava, ululava, apupava, aplaudia, gritava, cantava. Era um som ensurdecedor, assustador, opressor. Se, por um qualquer acaso do destino, uma porta do Coliseu se abrisse e ele tivesse conseguido iludir a guarda pretoriana, não escaparia certamente à torrente de multidão que se precipitaria sobre si.
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Roma amava as lutas, o choque das armas no ar seco, o sangue ensopando a terra branca da arena de vermelho negro, o odor a medo e morte. Roma lambuzava os beiços de prazer com o sabor da morte. Os jogos eram dos poucos entetenimentos da populaça, cansada de ser explorada e sedenta de festa. E se a festa se fazia à custa de alguns poucos inocentes, que importava isso? Roma queria, exigia morte.
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Lá ao fundo, dois cristãos andrajosos tremiam como varas verdes, amarrados a um poste de madeira, enquanto um possante tigre listado de preto e amarelo rondava o perímetro, ainda acorrentado. O animal era gigantesco. Era a primeira vez que estava frente a frente com um. Tal e qual um gato, mas dez vezes maior, o tigre caminhava de um lado para o outro, compassadamente, cheirando as presas, as patas felpudas pousando suavemente no chão, os olhos amarelos vivos, que não deixavam escapar nada. Parou e mirou-o, lá do fundo. Depois continuou a rondar os pobres cristãos.
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Os dois homens frágeis olharam-no como se ele fosse o Messias. À medida que se aproximava percebeu que murmuravam algo, uma ladainha trémula, fervorosa. Oravam, porventura, ao seu Deus, fosse ele quem fosse, por uma salvação miraculosa.
Mas a única pessoa ali que os poderia salvar, seria ele próprio e ele não sabia se toda a força dos seus músculos treinados, nem toda a perícia aprendida em anos de lutas, seriam suficientes para derrubar uma besta de 300 quilos, ágil como um relâmpago e astuto como nenhum outro.
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Lá em cima, na tribuna real, o imperador envolto em vestes brancas e douradas e rodeado por uma nuvem rosa de concubinas vaporosas, levantou-se. Dirigiu-se lentamente até debaixo da tribuna e proferiu as palavras que todos os gladiadores devem dizer:
"Ave Caesar. Morituri te salutamos!" (Avé César. Nós, que vamos morrer, te saudamos.)
Apertou a lança e o escudo nas mãos e virou-se para enfrentar o felino. Um deles não sairia vivo dali.
Quanto aos cristãos, mesmo que conseguisse matar o tigre, a sua sorte dependeria do humor do Imperador nesse dia. Deus, fosse ele quem fosse, fechara os olhos.
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2 comentários:
Gostei.
Obrigada :)
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