domingo, 3 de maio de 2009

EM BUSCA DE PALAVRAS 69

Shakespeare Atrás das Grades
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"Tal como vós de crimes
Sereis perdoado
Com vossa indulgência
fazei-me libertado"
William Shakespeare - A Tempestade
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Estamos no Complexo Prisional de Luther Luckett (Kentucky), uma prisão de segurança média, que alberga 1100 reclusos. Segurança média significa que possui um perímetro duplo a toda a volta e um cordão de defesa armado, com 4 torres de vigia armadas e alerta 24 horas por dia. Quanto aos reclusos, os crimes variam da pedofilia, aos assaltos à mão armada, até aos assassínios em primeiro grau.
Alguns dos homens mais perigosos dos EUA estão retidos aqui dentro, a cumprir penas que variam dos 20 anos a prisão perpétua, sem possibilidade de recurso a liberdade condicional. E destes, alguns escolhidos a dedo podem ter a oportunidade única de embarcar numa viagem tão original e surpreendente, quanto perigosa - ensaiar e representar uma peça de Shakespeare diferente todos os anos, com a ajuda de Curt Tofteland, um professor de teatro que trabalha voluntariamente para, nas suas palavras, "ser um catalizador para estes homens."
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É possível, perguntamo-nos, colocar criminosos a representar Shakespeare? Não só é possível, como pode ser profundamente redentor para homens que precisam, mais do que ninguém no mundo, do perdão alheio e, mais difícil ainda, do auto-perdão. Como diz Curt, Shakespeare adoraria estes "actores" improvisados, uma vez que no seu tempo quem costumava representar as suas peças eram precisamente assassinos, ladrões e patifes comuns da sociedade britânica da época. "A sua dádiva foi a observação do comportamento humano. Nas suas peças posso encontrar comportamento humano que é tão verdadeiro agora, como era há 400 anos."
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Para esta temporada que este extraordinário documentário relata, Curt escolheu propositadamente a peça A Tempestade, sobre a vingança e o perdão. A Tempestade conta a história de um homem com poderes mágicos, Próspero, que é traído pelo seu irmão e expulso do seu prórpio reino, lançado num barco à deriva para morrer. Consegue, no entanto, acostar a uma ilha onde, com os seus poderes mágicos, subjuga toda a população e reina de novo sozinho. Um dia, o destino faz com que também os seus inimigos se encontrem num barco à deriva no mar, próximo da sua ilha e Próspero invoca uma enorme tempestade para os fazer naufragar. O barco vem parar à ilha e Próspero tem agora a oportunidade de se vingar ou de perdoar o mal que lhe fizeram. Que fará ele?
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Big G pensava que os reclusos dariam bons actores, porque estão habituados a mentir e a representar. Mas descobriu que não podia estar mais enganado. Na realidade, eles devem trabalhar com a verdade, procurando a incorporação do personagem. Curt explica-lhes que "os grandes actores são grandes observadores da vida" e que incorporar um personagem não é tão simples como possa parecer, obrigando a um verdadeiro mergulho no fundo de si próprios e a um confronto com as suas próprias verdades.
Leonard, o pedófilo em recuperação, parece ser o filósofo do grupo. Ele afirma que uma das coisas mais notáveis no mundo é pedoar alguém e que Shakespeare entende isso porque entende que todos nós precisamos de ser perdoados por alguma coisa, o que varia é apenas o grau. Leonard tem um pedido: não deseja ser recordado pelo pior acto que cometeu, mas sim que a sua vida possa ser olhada na totalidade e que alguém possa ver a balança equilibrada, o que seria uma forma de redenção. Mais raro do que a vingança neste mundo, afirma, é o perdão e são precisamente os que menos o merecem que mais precisam dele.
E quando Leonard afirma que se não houvesse perdão no mundo, haveria uma espécie de anarquia moral, percebemos que ele tem razão. Que o perdão tem de existir, não porque nos possa beneficiar a nós ou aos prevaricadores, mas porque todos viremos a precisar dele alguma vez nas nossas vidas e só então entenderemos o quanto dele precisamos.
E recordo-me subitamente de Richard Kuklinsky, o impiedoso e frio assassino da máfia, que verte lágrimas sentidas quando diz que desejava apenas uma coisa no mundo - que a sua mulher e os seus filhos fossem capazes de o perdoar.
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É essa a lição de Shakespeare, o grande observador do comportamento humano. E é essa a lição de Hal, Leonard, Desmond, Big G, Red e Sammie, alguns dos grandes prevaricadores deste mundo.
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Texto inspirado no visionamento do documentário de Hank Rogerson para a National Geographic - "Shakespeare Behind Bars".
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