quarta-feira, 30 de julho de 2008

MURMÚRIOS DE LISBOA LXVI

ROSÁRIOS
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Quinta da Regaleira - Interior da Capela
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Sentou-se ao meu lado no autocarro. E benzeu-se. Trazia um boné de pala azul na cabeça e vestia uma camisa branca de corte antigo, umas calças cinzentas, meias verdes e umas sandálias castanhas. O rosto tinha mais de 70 anos, certamente. Os seus lábios moveram-se e as mãos seguraram o terço de contas creme e pretas debaixo da edição do dia do Metro. Começou a desfiá-las.
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Ao seu lado, eu desfiava o meu rosário. É cor-de-rosa. Tem o formato de uma pedrinha de rio lisa e de cantos redondos, achatada. Chama-se Zen Stone. E é fabricado pela Creative. No meio tem um écran minúsculo preto e redondo por onde passam as minhas contas. Cada uma tem nomes e uma infinitude de sons diferentes.
Nessa manhã eu desfiava o meu rosário cor-de-rosa, porque aqueles são os meus deuses. Não são divinos, nem são transcendentais, nem vivem em nenhum Olimpo ou nenhum Céu inatingível, se bem que a maioria deles viva bem melhor que aqueles que os ouvem.
Eu desfiava os meus deuses, porque precisava deles. Desfiava uns em particular. Enquanto alguém que me é muito querido e que também acredita naqueles deuses, estava deitado numa mesa de operações, eu desfiava o meu rosário para ele, para que de algum modo os “nossos” deuses estivessem com ele. E estiveram. Os “nossos” deuses e um cirurgião competente ...
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No mesmo dia em que a "minha" pessoa saía do hospital, entrava para a cama ao seu lado uma criança de 17 anos, também filho de médico. Mergulhou, bateu com a cabeça e ficou tetraplégico. Pedia ,constantemente a presença da enfermeira. Ouvia-se a mãe chorar lá fora, num desespero indescritível.
Espero que o Deus do senhor do rosário esteja com ele, para o que for que ele estivesse a precisar. Não consigo imaginar o sofrimento daquela criança, nem dos seus pais. Esta canção também é para eles.

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