segunda-feira, 16 de novembro de 2009

PALAVRAS ESTÚPIDAS 78


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Somos efémeros. Nada perdura. Somos pestanejares na imensa sinfonia celestial. Somos como formigas, lançadas ao acaso, espezinhadas, varridas, sopradas. Mao-Tsé-Tung tinha razão quando disse que um milhão de mortos é apenas estatística. Somos meros acasos milagrosos, vírgulas na gigantesca enciclopédia da vida. Mesmo os maiores de nós, apenas deixam uma frase completa.
Nada faz sentido, a não ser o sentido que lhe queiramos dar. Afectos. Ouço muito falar deles. Não passam de genética e química. Somos reféns da Tabela Periódica. E o nosso maior tesouro é também a nossa maior maldição - a inteligência. Que nos oferece consciência e, consequentemente, noção da finitude.
As religiões brotam precisamente do nosso pavor do fim. Não ser é-nos estranho, um conceito impossível de imaginar, como a extensão do Universo ou a quantidade de grãos de areia num único areal. E por isso criamos mundos alternativos, onde esse fim não existe ou se prolonga um pouco mais, onde tudo é eterno e doce e pleno de segurança porque duradouro.
Nesta selva de acidentes que é a vida, de tentativas falhadas e bem sucedidas, neste laboratório vivo de experiências infinitas, apenas o amor se eleva acima do turbilhão escuro da lotaria de possibilidades. Não porque exista, de facto. Mas porque ao crermos nele, o criamos.
Não sei qual é a origem da expressão "fazer amor", "make love", "faire l'amour". Mas faz sentido que assim se diga porque é isso na realidade que duas pessoas fazem quando se amam - criam-no do nada, a partir do vazio terrível do sem sentido. E o amor real, verdadeiro, profundo, aquele que de nós exige por vezes o impossível e nos transforma em gigantes inabaláveis, é a única coisa que poderá dar sentido às nossas miseráveis, insignificantes, passageiras, efémeras vidas.

2 comentários:

André disse...

Este texto começa de um modo absolutamente fabuloso. Tem 2 frases que considero das melhores "quotes" que já vi, "nada faz sentido.. " e "o nosso maior tesouro...". Mas depois.. Se nada faz sentido e os afectos não passam de química, porquê é que o amor é colocado noutro patamar?

O amor também não passa de afecto e de química. A autora deu o sentido que quis dar ao texto, mas seguindo a lógica introduzida pela própria autora não vejo razão para o amor estar acima da amizade ou do ódio ou de outro afecto qualquer.

A autora diz que "o amor real, verdadeiro, profundo, aquele que de nós exige por vezes o impossível e nos transforma em gigantes inabaláveis, é a única coisa que poderá dar sentido às nossas miseráveis, insignificantes, passageiras, efémeras vidas." E a cura para o cancro? e ajudar alguém? e sermos recompensados pelo nosso (eventual bom) trabalho ? Não são coisas que poderão dar sentido as "nossas miseráveis, insignificantes, passageiras, efémeras vidas"?

Assinado : um ex-admirador da autora (devidamente identificado)

Andrómeda disse...

Obrigada pelos elogios. É bom saber que há pessoas que lêem estas coisas.
Quanto à contradição, eu começo por dizer que: "Não porque exista, de facto. Mas porque ao crermos nele, o criamos." Acho que logo à partida a contradição fica resolvida :)