sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

MURMÚRIOS DE LISBOA IX

As Asas da Saudade
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Aeroporto de Lisboa - Chegadas

Há anjos a andar por aí. Às dezenas. Hoje encontrei um. Saiu na paragem do aeroporto. Tinha o cabelo branco e um olhar cansado e arrastava-se num sobretudo cinzento grande, apesar de não ter mais de 50 anos.

Vinha a ouvir música nos auriculares, mas eu sei que enquanto esteve sentado ao meu lado, esteve a escutar atentamente os meus pensamentos.

Eu divagava sobre?... festas de fim de ano … textos que tenho de escrever … como Lisboa tresandava a esgoto por causa da capa imensa de nuvens que sobre ela se estendeu o dia todo … as compras que tinha de fazer hoje à tarde … e mais uma dezena de coisas secretas todas baralhadas e amontoadas, que só ele ficou a saber.

Deixou-me. Mas não era o meu anjo da guarda. Era o anjo de outra pessoa qualquer. Deixou-me com uma sensação estranha. De saudade.

Saiu apressado. Provavelmente o seu vôo estava atrasado. Sei que as asas dele são pequenas e escuras, quase negras. Era um anjo que já passou por muita coisa, percebem? É deste tipo de anjos que mais gosto, ou não tivesse eu tendência para a trágico-comédia.

Gosto de almas perdidas, esventradas, sofridas porque são as mais belas. São as que dão valor aos pequenos e estúpidos momentos de felicidade que nos passam ao lado. Como este anjo que passou por mim, hoje.

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