terça-feira, 13 de janeiro de 2009

PALAVRAS ESTÚPIDAS 44

O Síndrome do Pessoa
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António Lobo Antunes (ALA): "Eu não gosto nada do Fernando Pessoa, acho-o um chato. Acho-o um chato, é um gajo que, como dizia a Maria Velho da Costa noutro dia... Aliás o Fernando Pessoa é um heterónimo do João Gaspar Simões, na minha opinião."
Inês Pedrosa (IP): "Era isso o que dizia a Maria Velho da Costa?"
ALA: "Não, isso digo eu."
IP: "E o que é que ela dizia?"
ALA: "Ela dizia que isto é um país de idiotas, em que as pessoas pensam que a tristeza é uma forma de inteligência, quando não é nada, é uma forma de estupidez! Portanto, o Pessoa é um gajo do caraças... Era isto que ela dizia... Olha, essa gosta de mim."
IP: "Mas há uma tristeza constante naquilo que escreve..."
ALA: "Tristeza, ou desespero, ou desesperança, não sei bem... Não quero falar mais disso. É feliz?"
Entrevista de Inês Pedrosa a António Lobo Antunes - Revista Ler -1988
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Todo o tuga tem o síndrome de Fernando Pessoa.
Ou seja, todo o tuga acha que é um grande poeta desconhecido e incompreendido, e quem diz poeta, diz canalizador, carpinteiro, médico, taxista, informático ou homem das obras.
Todo o tuga acha que ele, ele é que, ele é que sabe.
Se lêem Pessoa, entenderão o que quero dizer. Fernando Pessoa fartava-se de dizer que era um grandessíssimo génio, mas que o mundo ainda não o tinha descoberto. O problema (para nós, não para ele) é que o Fernando Pessoa ERA de facto um grande génio, o que é verdadeiramente desconcertante, porque aprendemos desde pequeninos a ciência da "falsa modéstia" e passamos a vida a achar que não se deve dizer que se é bom nalguma coisa, quando se tá mais que fartinho de saber que se é, só não vê quem é burro! ou invejoso!
E por isso passamos metade da vida a dizer "ai não, eu faço umas coisinhas, só isso, pára lá com isso que me estás a embaraçar, não exageres" e depois para dentro "claro! até que enfim que alguém tem a coragem de ver que eu sou muita bom, poça! irra!"
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Ora, o Fernando Pessoa, que foi educado na África do Sul à inglesa, mas viveu em Portugal, sofre do mal de todos os que, tendo duas "nacionalidades" (sei bem do que falo ...) vivem constantemente divididos entre elas. Ou seja, ele não tinha cá essas tretas das falsas modéstias tão características do tuga, sabia que era bom e passava a vida a dizer que o era, tendo até tido a incrível latosa de dizer que seria imortal. O Pessoa não era parvo! Podia ser doido, tarado, doente mental, esquizofrénico, ter múltipla personalidade, sofrer de maníaco-depressão, encher-se de rapé todo o santo dia e mais as milhentas coisas que dizem dele, mas parvo é que ele não era de certeza absoluta. Só que, como no fundo mais fundo de si mesmo era tuga, lá está, não saía da cepa torta, andava sempre lá a remoer aquilo entredentes, nos seus escritozinhos, curvado dentro do seu sobretudo triste e cinzento, debaixo do seu chapéu enterrado até às orelhas, por trás dos seus óculozinhos de intelectual.lfkfçl
E essa é precisamente a outra característica que também faz parte do Síndrome de Fernando Pessoa. Todo o tuga vive arrumadinho no seu cantinho tristonho e depois faz assim umas coisas às escondidas, umas coisas que ele acha do catano, mas que, lá está, nem se atreve a mostrar ao mundo não vá o mundo achar que ele se passou completamente, e que amandou os parafusos que ainda lhe sobravam na tola todos ao ar. Em vez disso, mostra assim na roda dos amigos e pronto, já é um pau. Só que, no caso do Fernando Pessoa, que era o típico tuga apagado e discreto, a trabalhar lá naquela repartição como escriturário numa ruazinha escondida de Lisboa, triste e sensaborão, que fazia justíssimo jus (passe o pleonasmo) àquela frase maravilhosa daquele escritor que agora não me lembro do nome e que disse o seguinte "Eu sou óptimo a pensar, sou bom a escrever e sou uma nódoa a falar" (revejo-me inteiramente, diga-se), o Pessoa, dizia eu, escrevia "às escondidas" volumes quilométricos de tinta, todos eles, sem excepção, da melhor literatura que este mundo já viu. É essa a diferença entre o Pessoa e o tuga que sofre do Síndrome do Pessoa.
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Serve, portanto, a presente para concluir que, a meu ver, mais do que o raio do coitado do andrógino Sebastião, o tuga vive é com o peso do fantasma do Pessoa em cima dos seus pobres ombros vergados com a típica "peninha de si próprio". Portugal é composto por 10 milhões de génios incompreendidos e desconhecidos, que só serão reconhecidos postumamente e que entretanto vivem vergados pelo peso da sua imensa tristeza, que mais ninguém pode jamais, achamos cada um de nós, almejar compreender em toda a sua amplitude.
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Talvez seja por isso que o Lobo Antunes não vá muito à bola com o Pessoa, algo que eu nunca compreendi, uma vez que os dois são tipo os meus mestres zen da escrita. Sempre me causou imensa impressão isto. Mas, agora, pensando bem, até consigo talvez entender esta comichão Lobo Antuniana. É que o Lobo Antunes, infelizmente ou não para ele, é tudo menos o tuga típico - era um giraço loiro e escandinaviano quando era novo, tem uns olhos azuis à Paul Newman nada latinos, escreve sobre o tuga como se fosse de uma raça à parte, tem sucesso ainda em vida e diz o que quer e lhe apetece sem problemas existenciais absolutamente nenhuns. Talvez seja por isso que aquela amostra de gente miópe, low profile e esquizofrénica que era o Pessoa, o irrite um tudo nada.
O curioso é que o Pessoa foi educado lá fora mas era o mais tuga que se possa imaginar, enquanto que o Lobo Antunes nunca saiu daqui e é o menos tuga que se possa imaginar. Ele há coisas desconcertantes ...
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