sexta-feira, 21 de março de 2008

EM MINHA CASA, NA PONTA DOS PÉS 36 (cont.)

Capítulo 10. AMAR UMA FLOR
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Considerou mandar Takemis segui-la. Considerou essa hipótese seriamente durante alguns dias. Mas depois, algo ocorreu que tornou desnecessária qualquer aventura desse género.
Nesse dia ela entrou muda, leu o que tinha a ler e saiu calada, com o cheque para os medicamentos na mão. Como sempre fazia, ficou a ouvi-la abandonar a casa. Eram os cinco minutos mais incomodativos do dia. Nesses cinco minutos que ela demorava para sair da biblioteca, encostar a porta atrás de si, pegar no casaco, vesti-lo, despedir-se da empregada (Clara já não fazia questão de se certificar que ela realmente saía) e de Wolf (que a seguia sempre até ao vestíbulo da entrada como se não acreditasse que ela pudesse deixá-los mais uma vez), sair para a rua, descer os degraus e afastar-se no seu passo pesado e inseguro, John desfiava pela milésima vez uma série de considerações que já não conseguia controlar.
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Voltarei a vê-la? (ainda resvalava para esse malfadado verbo)
Quererei voltar a vê-la? Quero vê-la …
Poderei continuar a viver sem ouvir a sua voz? A voz dela assombra-me …
Na próxima sessão devo dizer-lhe … (mas dizer o quê?) dizer-lhe qualquer coisa para que ela não pense que eu … não a vejo? … para que não pense que eu …
Mas porque é que estou preocupado com o que ela pensa? Não passa de uma criatura desprezível a quem os genes presentearam com um talento inato e extraordinário
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Era sempre interrompido por Wolf, que regressava ao seu colo para receber mais uma admoestação carinhosa. Mas nesse dia Wolf não regressou logo após a partida de Emily. Permaneceu junto da porta a rosnar baixinho. John farejou o ar e abriu lenta e suavemente a janela.
A um par de metros de distância ouviu Emily sussurrar bruscamente:
“O que é que estás aqui a fazer?”
E uma voz masculina retorquiu, num tom tranquilo:
“Vim ver-te.”
“Aqui?”
“Fui esperar-te à biblioteca. Não estavas. Disseram-me que estavas aqui.”
“Mas porque é que vieste aqui? Porque é que não esperaste em casa?”
“Porque não sabia a que horas voltavas e porque queria ver com os meus próprios olhos.”, o tom de voz continuava tranquilo, mas sob essa tranquilidade havia um subtil tom de acidez que passaria perfeitamente despercebido a qualquer pessoa menos atenta.
“Ver o quê?”
“O que fazes aqui.”
“Leio. Vamos andando.”, conseguia perceber que a voz de Emily estava tensa, apesar de sussurrada, querendo nitidamente afastar-se da casa o mais depressa possível.
“Lês? Não vamos a lado nenhum. Estou muito bem aqui. Lês o quê?”
“Livros.”
“Que espécie de livros?”
“Mas tu enlouqueceste? Agora andas a seguir-me?”
John sorriu imperceptivelmente, porque já aguardava aquela súbita explosão.
“Já te expliquei que vim ter contigo. Não posso? A rua também é dele?”
“Dele?”
“Sim, desse milionário entrevado. Que espécie de livros?”
“Pára com isso! Vamos sair daqui, por favor. Vou para casa.”, o tom elevou-se automaticamente com a provocação e John sentiu-se atingido pelas palavras brutas e frias daquele desconhecido, ao mesmo tempo que um ténue calor reconfortante lhe invadiu o peito quando ela reagiu.
“Não! Vais-me explicar aqui e agora o que é que andas a fazer nesta casa.”, e como se finalmente despertado pelo tom da voz dela, o estranho também explodiu subitamente, revelando um nervosismo até aí dissimulado.
“Larga-me!”, Emily esquecera-se, aparentemente, de se preocupar com a possibilidade de incomodar os ocupantes da casa.
“O que é que andas a fazer aqui, Emily? Diz-me!”
“O que é que te parece?”
“Bom, se não me dizes se calhar é melhor tocar à porta e perguntar.”, ouviu-o aproximar-se ameaçadoramente.

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