Gaivota sobrevoando o Castelo de S. Jorge
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O meu pai gosta de pássaros, pensou ela, enquanto ouvia um pássaro cantar lá fora e se lembrava disso. Não era costume pensar no pai, assim, logo pela manhã, mas nem sequer achou o facto estranho. Também não era costume pensar em escrever um texto sobre o pai, mas pensou nisso, e nem sequer achou o facto estranho.
É que ela nunca teve um relacionamento fácil com ele. E isto já é ser benevolente. Nunca teve nenhum relacionamento, por razões que agora não vêm ao caso e que seriam demasiado entediosas para dissecar (estaríamos aqui até à próxima semana).
Durante o dia esqueceu-se do assunto. À tarde disse em voz alta para si própria, “Porque é que tenho a sensação que tudo vai começar a descambar, a partir de hoje?”, mas estava a pensar numa série de outros assuntos que se estavam a passar na sua vida naquele momento, que nada tinham que ver com o pai.
À hora do jantar o irmão telefonou-lhe e disse-lhe que o pai tinha tido na noite anterior um ligeiro AVC. Nada de grave e ainda por cima estava no hospital de banco, portanto, nas melhores mãos possíveis. Ficara com o braço dormente e com o discurso alterado durante algum tempo.
Ela começa a não suportar esta maldição. Quando era mais nova achava graça quando foi percebendo que adivinhava coisas. Agora tem medo, porque sabe que vai saber sempre, antes, sem saber.
O meu pai gosta de pássaros.
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