domingo, 14 de setembro de 2008

CRÓNICAS DO PARAÍSO 2

FKLÇK
No Paraíso há dias que começam cedo. Demasiado cedo.
Acordar às 7 por nenhuma razão aparente. Voltar a acordar às 7.30 com os malucos dos caças que passam a rasar o Paraíso com um ruído de motores potentes que provocam síncopes cardíacas. Voltar a acordar às 8 por uma razão forte – foguetes em honra da N. Sra. das Dores. Voltar a acordar às 9 porque o vizinho de cima acorda cedo e decide martelar num Domingo. Voltar a acordar às 10 com a banda filarmónica em parada, com sua fanfarra de cornetas e bombos pela Avenida principal.
Desistir totalmente de dormir por volta das 11.
É dia de compras e primeira volta de reconhecimento pelo Paraíso.
Tudo está no mesmo sítio, como deve ser. Há mais um buraco aqui e ali, promessas de novos condomínios para embelezar a paisagem.
A feira instalou-se de armas e bagagens e a partir das 5 da tarde já se sabe que seremos brindados com check sounds perfuradores de ouvidos. 1 ... 2 ... 3 ... sssommm ... sssommm ...
l~çl
O estômago protesta e por isso ruma-se ao café do Firmo para um almoço tardio. Procuram-se as primeiras conquilhas do ano, mas hoje já só há ameijoas. Confirma-se que o Sr. Firmo ainda está vivo e de boa saúde. Já não tem dentes nenhuns (nem dentadura, claro está, modernices ...) mas ainda ouve e vê muito bem e, apesar de se baralhar todo nos pedidos, não usa papel.
Cheira-me a chuva e acerto. Já o Sr. Firmo tinha dito que não gostava nada daquelas nuvens lá ao fundo. E ele lá sabe. Tem mais de 80 primaveras e não deve nunca ter saído do Paraíso. Para quê? ...
Na praia descobrimos passadeiras novinhas em folha, que nos conduzem quase até ao mar, um privilégio inimaginável noutros tempos. O Paraíso cosmopolitizou-se.
Mas lá ao longe, no mar, ainda resistem os pequenos barcos de pescadores engalanados com bandeiras multicores, que aguardam a procissão da Nossa Senhora.
kçlk

lklçfk
A tradição ainda é o que era. Mesmo que a pobre senhora tenha agora de fazer um desvio significativo na sua caminhada sofrida até ao mar, para não ter de passar no meio das barracas de churros, tendas de rifas e carrinhos de choque que berram os últimos êxitos da Kátia Vanessa.
E lá se ouve o moribundo grito das sirenes marítimas clamando a protecção de uma senhora vestida de azul escuro que caminha silenciosamente por entre toldos amarelos e verdes, detritos de turistas e altifalantes histéricos.

Também as ondas ainda rebentam da mesma maneira e emitem o mesmo som imperturbável, cíclico, retumbante, segundo a segundo, como um relógio doce e poderoso, persistente, intocável e instintivo.

E a areia tem sempre a consistência perfeita.

Chove durante 5 minutos, umas amostras de gotinhas.

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Ruma-se à melhor Churrascaria do universo, para recolher um apetitoso frango e confirmar se o Adónis suado ainda lá trabalha. Está mais velho, mais gordo, mais cansado e mais encarnado do calor, mas ainda sobrevive. Enquanto ele me explica a composição dos 4 molhos diferentes, a minha mente vagueia com a ideia das suas gotas de suor pingando com sensualidade máscula sobre a pele estaladiça das aves no espeto.

A noite é agraciada com a voz de ouro de Marco Paulo, 18 churros pelo preço de 6 porque “A feira tá boa, menina” e um magnífico fogo de artifício nunca antes visto por terras do Paraíso.

Quinze gloriosos minutos com banda sonora sincronizada ao milímetro e foguetes deslumbrantes de cor, originalidade, precisão, matemática e impacto visual. Ao som dos Enigma e com direito a palmas gerais no final. Extraordinaire.
O Paraíso civilizou-se.

llklç


1 comentário:

Dry-Martini disse...

Depois ainda se queixa quando a acordo com telefonemas matinais. É apenas para a relembrar do paraíso :) Está a ver...